A agressividade de uma terapia à base de estatinas não se define apenas pela quantidade de doses recomendada. Há pelo menos seis tipos desses medicamentos anticolesterol no mercado, cada um com uma potência específica. A atorvastatina (princípio ativo do famoso Lipitor, entre outros) e a rosuvastatina (do Crestor) estão no arsenal das terapias mais agressivas. A meta nesse tipo de abordagem é a redução de 50% ou mais nos níveis de LDL. No rol dos tratamentos moderados, quando se pretende baixar as taxas de colesterol ruim entre 30% e 50%, estão a sinvastatina (do Zocor) e a pravastatina (do Pravacol). Aqui, um parêntese: no Brasil, os doentes tendem a receber doses inferiores às ideais. Já está comprovado que, a cada redução de 80 miligramas de LDL, diminui em 52% o risco de infarto e em 42% o de derrame.
Para quem está acostumado a acompanhar os níveis de colesterol, em sucessivos exames de laboratório, pode soar estranho não ter sido feita até aqui, nesta reportagem, nenhuma referência aos patamares ótimos de LDL. Eis aí outra grande mudança proposta pelas novas diretrizes — e um de seus pontos mais controversos. Esqueça as taxas ideais de LDL, que deixam de ser a meta crucial de correção cardiovascular. Até então, se o colesterol ruim de uma pessoa sem nenhum fator de risco estivesse em 220, ela seria orientada a baixar o LDL para 160 — ou 60 miligramas a menos. Agora, nas mesmas condições, o estímulo será para cortar o LDL em 50% — 110 miligramas a menos. “Não há evidências científicas fortes o suficiente para basearmos o tratamento do LDL em metas específicas”, disse a VEJA o cardiologista americano Robert Eckel, professor da Universidade do Colorado e um dos coordenadores das orientações recém-divulgadas. “Temos, sim, a certeza científica de que o benefício cardiovascular está diretamente relacionado às doses de estatinas prescritas e, repito, não a esse ou àquele parâmetro.” Os especialistas acreditam que essa reviravolta encontrará resistência no cotidiano dos consultórios médicos. “Aqui no Brasil, sabemos que ter metas é crucial tanto para os médicos quanto para os pacientes”, diz Hermes Toros Xavier, presidente do departamento de aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia. “Aumenta a adesão ao tratamento.”
As propostas contidas na cartilha das entidades de cardiologia americanas têm como base um teste para o cálculo do risco cardiovascular. Ele substitui a avaliação feita a partir do estudo de Framingham, o maior e o mais longo levantamento sobre a saúde do coração, em andamento desde 1948. O método antigo avaliava o risco de uma pessoa vir a sofrer uma doença do coração nos próximos dez anos. A partir da compilação dos quatro maiores estudos epidemiológicos realizados desde o lançamento da primeira estatina, a lovastatina, em 1987, os autores das novas diretrizes desenvolveram um questionário mais preciso do que o de Framingham. O teste de agora não dimensiona apenas o perigo das doenças cardíacas, mas também o de derrame. Além disso, são levadas em consideração as particularidades de diferentes raças (veja o quadro abaixo). O resultado avalia se a probabilidade de desenvolvimento de doenças cardiovasculares nos próximos dez anos é igual, maior ou menor que 7,5%. Esse é o único número, segundo as orientações americanas, ao qual devemos estar atentos. Ele é um dos parâmetros para usar e de que modo usar a estatina, tida como a aspirina do século XXI.
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